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sexta-feira, 21 de março de 2014

DIFERENÇA DE DOGMA, DOUTRINA E COSTUMES


DIFERENÇA 

DOGMA, DOUTRINA E COSTUMES




O ponto fundamental de qualquer religião é o seu conceito acerca de Deus. A teologia define, conceitua e organiza as revelações contidas nas Escrituras. Os dogmas, as doutrinas e a religião estão interligados de modo recíproco, de tal forma que é impossível ter um conjunto de doutrinas não dogmátizadas. Esses termos, ainda correspondentes, não são idênticos. Por isso, se faz necessário observarmos a diferença, e até mesmo a possível relação, entre dogma, doutrina, costume e religião.

DOGMA


1.1  Definição

A palavra “dogma” deriva do grego “dokeō”[1], sendo usado no Novo Testamento com o sentido de “mandamento, decreto, ordenança” (Lc 2.1; At. 16.4; 17.7; Ef 2.15; Cl 2.14). No aspecto filosófico, dogma redere-se  às “afirmações doutrinárias que expressam o ponto de vista oficial de um mestre ou escola filosófica em particular”.
Um dogma religioso é uma verdade bíblica baseada sobre a autoridade, oficialmente formulada por qualquer assembleia eclesiástica.
A primeira vez que a igreja aprovou declarações “dogmáticas” foi no Concílio de Nicéia, em 325 d.c, ocasião em que a consubstancialidade do Filho com o Pai foi declarada como uma confissão de fé.
A consubstancialidade do Filho com o Pai é o dogma segundo o qual o Pai e o Filho são uma mesma substância, ou seja, iguais, o que significa que ambos são Deus.
Na Idade Média, a igreja Católica Romana desenvolveu o conceito do depositum fidei (“depósito de fé”), conceito este que sustentava que à igreja era confiada um depósito de verdades, cujas ramificações podiam ser licitamente desenvolvidas pela igreja. Finalmente, através do Concílio de Trento (1545-63) e o primeiro Concílio do Vaticano (1870), os pronunciamentos dagmáticos da igreja (católica) passaram a ser consideradas infalíveis. Então, o dogma era visto, no catolicismo romano, até mesmo antes desta reforma, como uma verdade cujo conteúdo objectivo é revelado por Deus e definido pela igreja.[2]
Os reformadores se posicionaram contrariamente a esta visão católica, e sustentavam que todos os dogmas devem ser confrontados com a revelação de Deus nas Sagradas Escrituras. Karl Barth disse: “A Palavra de Deus está tão acima do dogma quanto os céus estão acima da terra”.[3]
Para os reformadores, fé é confiança pessoal em Deus, e relacionamento com Ele mediante Jesus Cristo, e o necessariamente o as-sentimento àquilo que a igreja ordena que seja crido.[4]  
Dogma veio significar uma sentença de verdade doutrinária. Este, por sua vez, foi reconhecido como sendo de alto valor eclesiástico, sem, contudo qualquer reivindicação à infalibilidade.


1.2  Credo Dogmático

Credo[5] dogmático[6] é uma declaração da doutrina tal como diz as Escrituras Sagradas. O credo dogmático, determinada pela sã doutrina, é um fundamento indiscutível da teologia cristã. Apesar de exis-tirem fragmentos do Credo dos Apóstolos, a primeira declaração dogmática universal ocorreu em 325 d.c., no Concílio de Nicéia, onde o Filho foi declarado igual ao Pai.

1.3  Dogmas Heresiológicos

Dogmas Heresiológicos são afirmações contrárias às Escrituras. Muitas declarações dogmáticas são propensas a distorcer as escrituras. Alguns exemplos são:

a)     Dogma ariano (325 d.C)
Nega as duas naturezas de Cristo.
b)    Dogma mariológico (Concílio de Latrão – 1198)
Afirma que Maria é sempre virgem e mediadora.
c)     Dogma Russelita (Testemunhas de Jeová)
Afirma que Satanás deu origem à doutrina da Trindade.

DOUTRINA


A palavra “doutrina” procede do grego “didaskō”[7] e significa “ensino ou instrução”.
Doutrinas não verdades fundamentais da Bíblia, dispostas de for-ma sistemática. São revelações da verdade como se encontra nas Escrituras. O Novo Testamento usa o termo de forma genérica para referir-se a qualquer tipo de ensino ou instrução. Como por exemplo:

a)     Doutrina dos fariseus (Mt 16.12);
b)    Doutrina dos homens (Mc 7.7);
c)     Doutrina dos apóstolos (At 2.42);
d)    Doutrina de demônios (1 Tm 4.1);
e)     Doutrina de Deus (Tt 2.10);
f)     Doutrima de Cristo (2 Jo 9).

Entretanto, há um padrão doutrinário estabelecido pelos apóstolos, conhecido como “sã doutrina” (1 Tm 1.10), “boa doutrina (1 Tm 4.6), “doutrina de Cristo” (2 Jo 9). Quando estudamos o texto de Hebreus 6.1-2 que entendermos tratar-se de uma forma universal e sistemática das doutrinas de Cristo.


DOGMA
DOUTRINA

É a declaração do homem a-cerca da verdade apresentada em um credo:
a)   Pode ser humana ou influ-ência demoníaca (1Tm 4.1; Cl 2.22);
b)   Seus assuntos podem se contrapor;
c)   Quando não enganosa, é suscetível ao erro;
d)   Alguns dogmas baseiam-se em interpretações equi-vocadas dos textos das Escrituras, sendo, muitas, vezes, desprovi-dos do a-val das mesmas (2 Pe 1.20);
e)   É a declaração do homem acerca da verdade.

É a revelação da verdade so-bre um tema teológico em par-ticular, como se encontra nas Escrituras:[1]

a)   É divina (2 Tm 3.16; 2Pe 1.19-21);
b)   É coerente nos assuntos (Jo 10.35);
c)   É verdadeira (Sl 119.86; Jo 17.17);
d)   Existe a aprovação das Escrituras e do Espírito Santo (1 Co 2.4-10);
e)   É a revelação de Deus e seu relacionamento com suas criaturas expostos nas Escrituras.


COSTUME

O termo “costume”, como o conhecemos, deriva de dois termos latinos: “com”, que significa totalmente; e “suescere”, que significa acostumar-se com. Logo, temos a definição “algo que alguém fica acostumado”. O correspondente em grego é “ethos”[9], de onde deriva a pa-lavra ética, que significa a conduta costumeira de um povo.[10]
Seguindo uma definição do dicionário, os costumes, numa sociedade específica, são práticas de comportamentos prescritos, do ponto de vista moral. Atitude ou valor social consagrado e que se impõem aos indivíduos do grupo e que se transmite através de gerações.[11]
A partir dessas definições podemos concluir que “costume” é tudo aquilo que um grupo, a partir de uma evolução histórica-cultural, acredita e afirma ser a melhor forma de conduta e comportamento para o coletivo, regendo, assim, a vida disciplinar diária daquela sociedade.
Podemos ainda avaliar, a partir da análise de Champlin[12], a conceituação de costumes segundo as ópticas filosóficas e religiosas.
 Vejamos:

a)     Na Filosofia
De acordo com as teorias humanistas e relativas, os cos-tumes formariam a base da ética. Dentro da teoria do com-sensus gentium (consenso comum), os costumes dos povos formar-se-iam mediante consenso coletivo, porquanto refle-tiam as leis naturais e a verdade. A partir desta teoria, algu-mas sociedades tendem por considerar os seus costumes como se fossem universais. No entanto, a ética absolutista e ateísta nega que os costumes sejam a base da verdadeira a-ção ética. Antes, essa base vem de alguma fonte externa ao homem, como por exemplo, Deus e a Bíblia, de tal modo que os homens receberiam as regras do certo e errado da parte de algum poder mais alto do que eles, e não dos costumes fixados através das experiências do dia-a-dia.

b)    Na Religião
O costume é uma questão meramente humana, embora pos-sa estar apoiada nas leis naturais e nos impulsos da consci-ência, estando assim em harmonia com a vontade de Deus. Por outro lado os costumes podem ser totalmente perversos, acompanhando a natureza pecaminosa do homem. Por conseguinte, um dito popular, que peca pela raiz, é aquele que diz: “A voz do povo é a voz de Deus”. Na verdade, em face da natureza pecaminosa e rebelde do homem, definitivamen-te  a voz do povo corresponde a voz de Deus; antes, geralmente contraria a vontade revelada de Deus. É precisamente por isso que o evangelho é pregado ao mundo inteiro, conclamando os homens ao arrependimento, ou seja, à mudança de atitude mental.
A ética alicerça-se sobre as leis naturais e sobre a revelação divina, mas jamais sobre os costumes sociais, partem eles de onde partirem. Podemos então perceber que um costume geralmente é um conceito que parte do censo comum, mas isso não significa que seja a verdade Absoluta.
De forma alguma estamos sugerindo que o costume gire sempre em torno do erro. O que pretendemos afirmar é que o costume jamais estará acima da verdade Escriturística, e sim que ele apenas é básico para elaboração de um sistema ético. Se assim não for, os costumes tornam-se dogmas, fazendo, assim, os conceitos serem obrigatórios, autoritários. A verdade é sempre maior do que qualquer costume.
Infelizmente, não são todos que compreendem este fato e acabam por tornar os seus costumes como sendo “a verdade”, passando a fazer com que estes sejam a tradição de determinado grupo. A questão da tradição vem à tona, na presente discussão, porque todas as denominações são, na verdade, resultantes de tradições que professam.
O teólogo Antônio Gilberto, com maestria, nos aponta pelo menos três diferenças básicas entre doutrina bíblica e costumes humano, quais sejam:

Quanto à origem
A doutrina é divina;
O costume é humano;
Quanto ao alcance
A doutrina é universal;
O costume é local;
Quanto ao tempo
A doutrina é imutável;
O costume é temporário;[13]









É certo que as doutrinas bíblicas geram os bons costumes, mas os costumes não geram doutrinas bíblicas. Há igrejas que têm um somatório imenso de bons costumes, mas são rasas no conhecimento das doutrinas. O prejuízo desse comportamento é que seus membros naufragam com facilidade no mar de heresias, justamente por não terem o lastro espiritual da Palavra.

 RELIGIÃO


No grego do Novo Testamento, o vocábulo “thrēskeía”[14] é traduzido por “religião” (At 26.5) e “culto” (Cl 2.18). Lactâncio, antigo escritor cristão, afirmou que a palavra “religião” era procedente do verbo latino “religare” que significa “tornar a ligar” e traduz a ideia de um “religamento das relações rompidas pelo pecado entre o homem e Deus”. Entretanto, essa afirmação tem sido contestada, pois segunto Teixeira, o particípio de “religare” dá o sentido de “pessoas piedosas, prestando culto e reverência a deuses”, o que este relacionado com o significado do original grego.[15]
Isto posto, religião relaciona-se às atividades que liga o homem a Deus numa determinada relação (At 25.19; 18.15; 26.3,5; Tg 1.26,27).

Relação Entre Teologia e Religião


Teologia é o conhecimento acerca de Deus, enquanto que religião é a prática que formalizou esse conhecimento. Religião e Teologia devem coexistir na verdadeira experiência cristã; todavia, na prática, às vezes acham-se distanciadas de tal maneira que é possível ser teólogo sem ser verdadeiramente religioso e, por outro lado, ser verdadeira-mente religioso sem possuir um conhecimento sistemático doutrinário.

“Se conheces estas coisas, feliz serás se as observares”, é a mensagem de Deus aos que lidam com a Teologia.
“Procura apresentar-te a Deus aprovado, como obreiro que não tem de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade.” (2 Tm 2.15); é a mensagem de Deus ao homem espiritual.





ESTUDO EXTRAÍDO DO LIVRO TEONTOLOGIA
 CURSO DE TEOLOGIA SISTEMÁTICA, IBT

Por Pr Eduardo Rodrigues
Lisboa - Portugal





[1] Idealmente, a doutrina é formada com o intuito de ser fiel às Escrituras e ao mesmo tempo dar atenção às tradições da igreja. Cf. GRENZ, J. Stan-ley; GURETZKI, David. Dicionário de teologia: mais de 300 conceitos teológicos definidos de forma clara e concisa. São Paulo: Vida, 2000. p. 42.
[1] δοkέω (dokeō) pensar, crer, supor, considerar, conforme podemos observar nos seguintes textos: Mt. 3.9; Lc 24.37; 1 Co 3.18; Hb 10.29. O termo pode significar “parece-me melhor, eu resolvo ou decido” (Lc 1.3). Cf. GINGRICH, F. Wilburt; DANKER, Frederick W. Lé-xico do N.T: grego/português. São Paulo: Vida Nova, 1984. p. 58.
[2] Cf. MCKIM, D.K. Dogma. In: ELWELL, Walter A. (ed) Enciclopédia historico-teológica da igreja cristã. São Paulo: Vida Nova, 1988. V 1 (A-C). p. 490.
[3] Cf. BARTH, Karl. Apud MCKIM, D.K. Dogma. In: ELWELL, Walter A. (ed) Enciclopédia historica-teológica da igreja cristã. São Paulo: Vida Nova, 1988. V 1 (A-C). p. 490.
[4] Cf. MCKIM, D.K. Dogma. In: ELWELL, Walter A. (ed) Enciclopédia historica-teológica da igreja cristã. São Paulo: Vida Nova, 1988. V 1 (A-C). p. 490.
[5] Credo: termo oriundo da palavra latina credo (creio); trata-se de uma declaração da fé cristã. Primordialmente, o propósito dos credos era de apresentar uma súmula da doutrina cristã. Posteriormente, os credos tornaram-se ferramentas para instruir os novos convertidos, para rebater as heresias e até mesmo para serem usados no culto. Há três famosos credos que foram estabelecidos durante os cinco primeiros séculos da história eclesiástica, que são: credo Apostólico, o Credo de Niceno e o Credo de Atanácio. Cf. GRENZ, J. Stan-ley; GURETZKI, David. Dicionário de teologia: mais de 300 conceitos teológicos definidos de forma clara e concisa. São Paulo: Vida, 2000. p. 32.
[6] A dogmática é uma das mais tradicionais disciplinas da teologia cris-tã. Sua tarefa especial é a implantação crítica das doutrinas da fé da igreja à luz de nosso conhecimento a respeito das origens do cristianismo e do desafio representado pela situação contemporânia. Cf. BRAATEN Carl E.; JENSON, Robert W. Dagmática cristã. São Leopoldo: Sinobal, 1990. p. 29. Na ortodoxia oriental, dogmas são ensinos oficialmente aceitos pela igreja, e não meras teo-rias desse ou daquele teólogo. Cf. GRENZ, J. Stanley; GURETZKI, David. Dicio-nário de teologia:  mais de 300 conceitos teológicos definidos de forma clara e concisa. São Paulo: Vida, 2000. p. 42
[7] Διδάσkω (didaskō), ensinar (Mt 1.21; At 15.35; 1 Co 11.14). O termo possui a mesma raiz de didakhê (διδαχή), “ensino como uma actividade, instrução”. Em sentido passivo significa “o que é ensinado”, “ensino”, “instrução”. Deste termo é formado didaskalos (διδάσkαλος), “mestre” ou “professor” (Rm 2.20; Hb 5.12); didaktos (διδαkƮός), “ensino” ou ”instruido”; didaktos (διδαkƮός θϵοv), isto é, “ensinado por Deus” (Jo 6.45).  Cf. GINGRICH, F. Wilbur; DANKER, Frederick W. Léxico do N.T: grego/português. São Paulo: Vida Nova, 1991, p. 56.
[8] Idealmente, a doutrina é formada com o intuito de ser fiel às Escri-turas e ao mesmo tempo dar atenção às tradições da igreja. Cf. GRENZ, J. Stan-ley; GURETZKI, David. Dicionário de teologia: mais de 300 conceitos teológicos definidos de forma clara e concisa. São Paulo: Vida, 2000. p. 42.
[9] ἒθος (ethos) hábito, costume, uso. Cf. GINGRICH, F. Wilbur; DANKER, Frederick W. Léxico do N.T: grego/português. São Paulo: Vida Nova, 1991, p. 56.
[10]  Cf. CHAMPLIM, R.N; BENTES, J.M. Enciclopédia de Bíblia, teologia e filosofia. São Paulo: Candeia, 1991. V1 (A-C), p. 944.
[11] Cf. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. p. 490.
[12] Cf. CHAMPLIM, R.N; BENTES, J.M. Op. cit. p. 944.
[13] GILBERTO, Antônio. Manual da Escola Dominical. Rio de Janeiro: CPAD, 1995. p. 85.
[14] θρησkϵία (thrēskeia), religião ou culto, Cl 2.18 e Tg 1.26. Cf. GINGRICH, F. Wilbur; DANKER, Frederick W. Léxico do N.T: grego/português. São Paulo: Vida Nova, 1991, p. 98. Thrēskeía é o termo empregado para classificar ritos e leis que regem uma sociedade religiosa (At 26.5) e atos filantrópicos (Tg 1.26,27). Cf. ESCOLA PREPARATÓRIA DE OBREIROS SILOÉ – EPOS. Heresiologia. Joinville: Equipe de Pesquisa, 2002. p.11.
[15] Deve-se observar que a etimologia latina desta palavra difere de au-tor para autor. Para Cécero, ela vem do latino religio e deriva-se do verbo relegare ou seja, reler, que significa cuidadosa reconsideração e profunda concentração da mente em objetivo ou de culto externo, chama-se latreia – Culto (ver Rm 12.1) e thrēskéia – religião (Tg 1.27); no sentido subjetivo, chama-se pistis – fé; enquanto que eusebeia – piedade (1 Tm 4.7,8) inclui o sentido dos dois grupos de palavras. Thrēskeía pode significar religião real, mas refere-se mais a organização exterior, enquanto eusebeia indica uma relação pessoal e real com Deus e só se refere a uma comunidade quando esta é composta de verdadeiros adoradores. Cf. TEIXEIRA, Alfredo B. Dogmética evangélica. 2. ed. Rio de Janeiro: Editora Pendão Real, 1976. p.43.